O tédio e o ócio criativo

As últimas duas semanas com feriados em dias estratégicos para emendar um feriadão, permitiram um gostinho do que é a vida em um ritmo menos acelerado – uma pausa quase obrigatória na ânsia de produtividade.

O tédio é uma ótima maneira para surgirem novas ideias, soluções e criações. Acredito que o ócio criativo vem da inquietude que o tédio causa – talvez um problema moderno de não saber apenas existir, sem fazer nada.

Tempo este cada vez mais raro, já nos é tomado com estratégias terríveis de dopamina, doom scrool e conteúdo infinito. Vendemos nosso tédio para consumir publicidade em tempo de tela.

Mas esta inquietude do tédio pode ser uma força para o processo criativo – sem ser necessariamente captado para a produção (de trabalho, dinheiro, retorno, capital) e sim criação nas artes – sentei para escrever num domingo a noite e nos últimos dias sinto u comichão para voltar a fotografar toda vez que saio caminhar.

Usar o tédio conscientemente como ferramenta de produção – mesmo que artística – não seria o cúmulo da captação dos nossos sentimentos pela própria ânsia de produtividade?

A ânsia da produtividade

Nas últimas semanas caí na tenebrosa espiral negativa da sensação de improdutividade.

Ela começa com uma sensação de improdutividade causada por um motivo qualquer (uma consulta médica, a cabeça zureta, luto, se informar demais, o que seja) e o pensamento de culpa “Hoje não consegui produzir muito, vou ficar até um pouco mais tarde para compensar”.

E você fica. E produz pouco, pois está exausto. E acorda ainda mais cansado no dia seguinte, num estado mental deplorável, novamente improdutivo e pensa: “Bom, vou ficar até mais tarde para compensar e amanhã tudo normaliza”.

Mês passado peguei projeto demais, um projeto estimado errado, os mercadinhos continuam dando mais trabalho do que deveriam e o Condado está sempre alugado e com um pepino ou outro para resolver – o resultado foram 3 semanas trabalhando sem final de semana.

Coincidência ou não, adoeci.

Não sei se foi gripe, se COVID, alergia ou simplesmente um pedido de ajuda do corpo, pois a cabeça já foi pro beleléu há muito tempo.

Determinado a não trabalhar neste final de semana que passou, me limitei a trabalhar sábado de manhã.

Quando parei para fazer almoço lembrei de uma longínqua época em que eu era feliz e sabia – antes de me envolver novamente com varejo (mercadinhos) e sítio eu tinha mais controle sobre o meu tempo, trabalhando apenas com consultoria e desenvolvimento.

Conseguia treinar em paz, acordar quando o corpo pedia e também não atender meu telefone. Vivi o sonho neste período da vida, e consegui fazer um experimento de redução de carga horária sem impactar nos ganhos financeiros.

Outra época e outra saúde mental – que tenho dúvidas se algum dia voltará.

E neste sábado, abrindo uma cerveja e pensando em como lidar com o tédio de não trabalhar, tocou a melhor versão de Take On Me e num verso lembrei deste tuíte (skeet? bluskeet? post) do Tarsis:

Aprender a viver devagar é um exercício constante. Desligar o alarme de sobrevivência é difícil demais

— Tarsis Azevedo (@tarsisazevedo.com) 1 de abril de 2025 às 22:51

Aprender a viver devagar (Slowly learning that life is okay… tupá tupá) é um exercício que precisa de treino e monitoramento constante, pois – em qualquer descuido – o medo ativa o piloto automático, e você estará mais uma vez se perguntando, beirando a estafa e sem tempo para o melhor da vida (improdutividade, ócio criativo, matar tempo): o que é que estou fazendo da minha vida?